27/07/2011

MENSAGEM INTRÍNSECA - PRESIDENTE LULA






      
Próximo se fazia das oito horas da noite. Sem pressa vestiu seu pijama, escovou os dentes, penteou os cabelos e a barba e dirigiu-se para a sala de vídeo. Sentou-se em uma confortável poltrona colocando os pés num puff e as costas numa pequena almofada de seda. A sala, ampla e elegante, estava repleta de objetos de valor, muitos deles trazidos de longe - memórias vivas de suas andanças pelo mundo. Seu olhar deteve-se numa pequena estatueta de bronze, recebida num momento difícil de sua vida pública, onde estiveram prestes a ruir todos os seus projetos mais entusiasmados e audaciosos. Passou a mão na barba como a buscar a realidade daqueles momentos. Seu semblante endureceu ao recordar companheiros que, na avidez de dinheiro e posição, o tinham apunhalado pelas costas. Quantos deixaram cair suas máscaras mostrando desejos imbecis de subestimá-lo. Quantos, mais poderosos, tiveram suas máscaras de ferro arrancadas, ao exibirem em suas mãos as digitais apagadas pela avidez da ganância.
O televisor acordara-lhe os pensamentos pela chamada do noticiário. Uma mulher elegante, de fisionomia austera, invadiu a sala. Estava rodeada de repórteres e respondia irritada, algumas perguntas a ela dirigidas. De repente sentiu-se como que a incorporando – sabia tudo o que ela estava passando - temeu que em sua irritabilidade ela colocasse uma vírgula indevida em alguma frase, o que seria suficiente para que tivesse todo seu pensamento distorcido. Enquanto a mulher falava, recordou-se de quantas foram as vezes em que também assim estivera. Não era mais o foco das atenções, mas por muito tempo ainda seu nome estaria ligado a todos os acontecimentos políticos de seu país. De repente lembrou-se de um sonho que tivera e sorriu da mensagem intrínseca que ele deixara - O HOMEM QUE PENSA EM SER PRESIDENTE, DEVERÁ PENSAR PRIMEIRAMENTE EM SER EX-PRESIDENTE. A princípio desprezara tal raciocínio, mas ao longo do dia passara a buscar a compreensão daquela mensagem. Sorriu ao lembrar-se de um amigo ao qual contara o sonho. Dissera-lhe ele:
- Amigo você não quebrou a barreira do tempo e sonhou atrasado, ou seja, já eras ex-presidente quando tivestes esse sonho, mas não te preocupes com essa mensagem, inconscientemente já te preparavas para quando esse momento chegasse. Fizeste um belo governo! Mas passe para ela a mensagem do teu sonho!
E sorrindo complementou:
- Quanto a mim se tivesse pensado que viria a ser ex-marido jamais teria casado!
Brincadeira à parte sentira uma sensação estranha a incomodar-lhe: números, cifras, relatórios, deputados, governadores, etc., passaram em sua mente como coadjuvantes de um grande filme onde era protagonista. Governara seu país por oito anos. Quanta responsabilidade tivera em suas mãos. Quantos sorriram ou choraram às suas decisões.
A vida reservara-lhe o que em sonhos não ousara sonhar. Como poderia, enquanto vendedor ambulante, engraxate, office-boy ou aprendiz de torneiro mecânico, pensar em ocupar o cargo máximo do seu país? Logo ele que tão pouco tempo havia dedicado aos estudos. Jamais! Porém sua vontade determinada de lutar pela igualdade social fizera-o galgar degraus de forma inusitada e logo estava aliado a intelectuais e líderes sindicais a fundar um partido político. Pensou no sonho - tinha a consciência do dever cumprido, fizera muito do que tinha prometido durante a sua campanha sabia, entretanto, que muito também ficara por fazer, os anos passaram rapidamente e muitos projetos iniciados não puderam ser concluídos, passara adiante o bastão, entregando-o em mãos na qual plenamente confiava. Mas e os abutres? Seriam eles descobertos a tempo de não comprometerem todo um trabalho? Só o futuro daria a resposta às suas perguntas.
A entrevista prosseguia com perguntas sobre taxas de juros, câmbio, ajustes fiscais, etc., e para todas elas as respostas eram claras e firmes. Um jornalista, declaradamente da oposição, perguntou sobre os programas sociais, questionando-a se iria mantê-los. Naquele momento ele sentiu-se como um técnico de futebol à beira do gramado desejando entrar no jogo e defini-lo. Levantou-se da poltrona encaminhando-se ao televisor desejando poder alertar a mulher quanto ao que deveria responder, porém ficou dividido pelo tempo e inquieto por não conseguir conjugar, na primeira pessoa, verbos no futuro do pretérito - Na verdade não queria estar absorvendo os problemas como se lhe coubesse solucioná-los. Algumas conjunções incômodas atrapalhavam seu raciocínio. Mergulhado em pensamentos não ouvira tudo o que ela respondera, mas o seu nome havia sido falado ao final da entrevista. Ligou para o amigo perguntando o que fora dito sobre ele. E o amigo disse:
- Ela, ao ser comparada a ti, disse que a estrada ainda é bastante longa para alcançar-te e que a continuidade de todos os programas sociais do teu governo é questão de honra.
E em tom de brincadeira complementou:
- Quanto a mensagem do teu sonho, só para ilustrá-la, tu já pensaste se ao invés de ti fosse o Bush que a tivesse recebido? Das duas uma: ou ele teria desistido de candidatar-se a ser presidente ou não teria sido alvo daquela sapatada.
E ambos sorriram ao lembrarem o lado cômico da cena.


Suely Sousa
Recife/PE

21/07/2011

IDEAL PERDIDO

O homem que eu amei
jamais existiu!
Ele vivia em minha mente
até o dia em que partiu.
Partiu porque eu fiz dele
naquele corpo a sua extensão
e ele foi se perdendo
em meio à confusão.
Eu o vi naquele sorriso
Naquele jeito brincalhão
Naquele olhar misterioso
Naquela determinação.
Joguei então na sorte
com a minha vida a apostar
que ali estava o homem
que eu estava a procurar.
Vieram então as brigas
os conflitos de opinião
grosserias inesperadas
e uma enorme decepção:
De ver o meu ideal perdido
depois de tanta retenção,
por uma atitude precipitada
pela carência e a solidão.
Mas quero trazê-lo de volta
e revesti-lo de proteção,
para que não mais se exponha
a confundir-me o coração.

Suely Sousa

15/07/2011

AMOR VIRTUAL


Busco-te em minha solidão,
em minha ânsia,
em minha esperança.
Busco-te nas palavras,
nas linhas,
nas estrelinhas.
Busco-te pelas manhãs
em meio aos afazeres do dia
temendo que logo encontres
quem te faça companhia.
Busco-te nas noites
estejam quentes ou frias
ou até ser vencida a insônia
pelo cansaço do dia.
Busco-te com olhos vidrados
garimpando na tela
te procurando pelo tato
sem rosto
sem traços.

Suely Sousa

14/07/2011

PUBLICITÁRIOS (PERFIL)

Buscam palavras,
cores,
efeitos.
Mentalizam envolver-te
comover-te,
sensibilizar-te.
Criam em ti necessidades.
Estimulam teus desejos,
carências,
frivolidades.
Escondem tuas imperfeições.
Chacoalham teu ego.
Ativam teus gostos,
tuas preferências.
Vêem-se em ti!
Sentimentos abertos,
Olhos prostrados,
Atentos!
Traçam tua personalidade.
Identificam teu perfil,
Imaginam teus anseios,
prioridades.
Aliam sensibilidade,
inteligência,
esperteza.
Jogam suas redes infalíveis...
Trazem-te vencido
Satisfeito (???)
Dominado!
Assim são eles:
Estrategistas convictos.
Vendedores de desejos,
Compradores de desafios.

Suely Sousa
Recife/PE

08/07/2011

FILHOS DE ESTUPROS

 
Um rapaz angustiado por uma história do passado, mas não era uma história qualquer, era a história da sua vida, mais precisamente da sua concepção. Um rapaz que buscava nas fisionomias que por ele passavam, uma que pudesse conter o código da sua geração, que temia seus desejos, preso aos fantasmas que trafegavam na sua história.

LIVRO EDITADO EM 2008 - EDITORA NOVO HORIZONTE RECIFE/PE

Página 26   


- Filho, não fique obcecado por esta história. Muitos são os filhos apenas do sexo. O fato de uma pessoa ter pai e mãe não significa que tenha havido amor em sua concepção, muitas vezes há amor, mas o filho não estava sendo desejado naquele momento, entende? Muitos rapazes, assim como você, tornam-se pais sem querer, e assim por diante. O meu sofrimento maior é não saber quem é ele, não por mim, mas por você, por essa cobrança que é feita, por essa hipocrisia de todos pensarem que são filhos do amor.



E-mail - suelybsousa@hotmail.com

NIPPON


Aonde o sol chegou primeiro
mais cedo a noite se fez
e olhos que inchados se abriram
ainda “inchados” fecharam-se outra vez.
Adormeceram os sorrisos tímidos
as mentes fervilhantes de imaginação
abriram-se mãos calejadas
sobre futons macios estendidos no chão.
E a ilha mergulhou em sonhos
quando um grande estrondo se fez...
e a Pangea voltou gloriosa
juntando ilhas e continentes outra vez!
Mas o sol se fez mais forte
e iluminou outra vez o Japão
que aliviado acordou sorrindo
vendo o mar banhar o seu chão.

Suely Sousa
Recife/PE


05/07/2011

VIAGENS MÁGICAS

Thiago estava num grande dilema – pensou, pensou e, por fim, resolveu apenas imaginar sua ida a Holanda. Deitou cobrindo-se até a altura do pescoço, fez um exercício de relaxamento e ficou aguardando a grande viagem. Era assim que ele conhecia o mundo e, supostamente, as pessoas.

Thiago era puro espírito! Ele não concebia uma integração perfeita entre seu corpo e seu espírito, achava complicado deslocar-se até onde desejava e, assim, transcendia ao tempo viajando pelos continentes.

Pensei de início que talvez fosse ele apenas um sonhador, um escritor que se entregava ao pensamento, mas Thiago era diferente, ele voltava de suas “viagens” como se em verdade elas tivessem ocorrido. Não havia alucinógenos ou qualquer processo de indução àquelas viagens.

Observei-o em sua “chegada” ele estava feliz e bastante falante, disse ter conhecido lugares maravilhosos e em um deles uma garota portadora de uma enfermidade incurável, mas que lhe dissera que era feliz por tudo que já tinha ganhado da vida. Disse também que gostaria de ser como ele, para conhecer muitos países e pessoas de todo o mundo. Eu o olhei intrigado - Seria ele um louco? Mas que loucura tão fascinante era aquela que proporcionava tantas oportunidades de conhecimentos? Resguardei-me. Era hora de sairmos para almoçar. Ele olhou para mim e com um leve sorriso perguntou se teria mesmo que “levá-lo”, eu sabia que ele estava se referindo ao seu corpo e respondi-lhe, com ar de cumplicidade, que teria que levá-lo.

Eu não tinha o dom de afastar-me assim tão livremente, meu pensamento era induzido, preso por conceitos, valores, afetos, desafetos. Thiago era livre! Ele não buscava as mesmas coisas que buscam a maioria das pessoas, ele buscava a mansidão, a serenidade, a felicidade, o amor. E ele as encontrava em suas viagens mágicas.

Pergunte-lhe um dia: Você não gostaria de ir a uma favela, um hospital ou a uma penitenciária? Lá estão os doentes do corpo e da alma. Eles ficam aflitos em busca de uma palavra para aliviar-lhes as dores.

Ele olhou para mim, como que penetrando a minha alma, e disse:

- Eu procuro visitá-los sempre, porém eles não me vêem nem me ouvem, mas sentem-se um pouco mais aliviados. Se eu for em realidade estarei levando meus limites!

Depois sorrindo disse: Você não entende o que falo, acha que sou um louco, um pretensioso que pensa ser Deus, não é?

E continuou: Eu sou apenas um viajante que aprendeu a encurtar caminhos. Não preciso morrer para saber o que é a morte e digo-lhe que qualquer pessoa pode conseguir viajar sem drogas ou alucinógenos, apenas aprofundando o desejo, direcionando a mente a libertar-se do corpo, e assim, solto, eu vou longe...

Fomos almoçar. Ele serviu-se de porções mínimas, bebeu meio copo d’água, apreciando sua limpidez, falou sobre o universo e também sobre as profundezas da terra, agradecendo o alimento e a todos que o serviram. Depois sorriu, um sorriso iluminado.

Criatura fantástica, pensei.

SUELY SOUSA

01/07/2011

REFLEXÃO

O FUTURO DO MEU PASSADO
NÃO É O MEU PRESENTE
NEM DEVE SER CONJUGADO.
O FUTURO DO MEU PASSADO
FICOU NUM CANTO RECUADO
PERDIDO ENTRE CONCEITOS
DO CERTO E DO ERRADO
DE UM TEMPO LOUCO
E APAIXONADO.
VIVIDO!
MAS NÃO CONJUGADO.


SUELY SOUSA
RECIFE/PE